Como manter a chama do desejo - há duas chaves principais para haver permanência
do desejo anos a fio:
A primeira: é que o outro precisa saber que é
desejado, precisamos sinalizar cada um a seu modo de que o outro ainda é muito
importante para nós, muitas vezes ele é mas acabamos caindo na preguiça ou na
correria dos afazeres da vida e de casa, e não dá clima para expressar essa
importância, que está lá, viva, mas imanifestada.
A Segunda: chave
importantíssima é termos a coragem de encarar que não há parceiro ideal, aquele com quem sonhamos a
vida inteira não existe. O que há são os parceiros reais, pessoas com
farpas e sombras, e que vão nos machucar e nos desiludir. A magia da vida está
em nos associarmos a estas pessoas e vivermos um amor real, que nos torna
verdadeiramente humanos, pois o desejo um dia nos uniu àquele ser, sua beleza
única nos cativou, e agora o que temos na mesmice dos dias é o desdobramento
daquele ser; aquela maravilha inicial não sumiu, apenas se transformou, e nós
nos transformamos também, muitas vezes em direção ao que não
queríamos.
Transformados pelo tempo, estamos aqui, associados, e
precisamos reencontrar significados novos na relação. Às vezes em função de
metas novas que juntos faremos, ou mesmo por causa de sonhos de um e outro
individualizados mas com a presença cúmplice do outro em nossos caminhos. Mas há
sempre como reencontrar o mistério e o sagrado do outro nas relações longas,
quando assumimos corajosamente que não há como manter a jovialidade inicial, nem
com quem está conosco nem com mais ninguém.
Estamos maduros para o amor
quando não temos mais ilusões mas esperanças renovadas no simples fluxo do dia a
dia, quando sabemos que um dia nosso desejo escolheu aquele Ser. Casamos sempre
iludidos, ele diz, com a esperança de que o outro é o fim de nossas buscas pelo
companheiro ideal, "este sim! agora vai"...
O amor e a sexualidade
aplacam nossa angústia de existir, a angústia básica de sermos quem somos, de
termos errado tanto conosco e com os outros, a angústia da finitude, o aparente
absurdo da morte, e nesse sentido o psicanalista lá afirma: quanto mais angustiados, mais
queremos sexo. Quanto mais equilibrados, mais queremos o outro em
si...
O grande buraco da existência, agora digo eu, a aflitiva
angústia de simplesmente termos que viver nos faz andar por aí atrás de uma
outra metade, e aí namoramos, caçamos e casamos iludidos com a esperança de que,
finalmente, não estamos mais sozinhos, de que agora temos onde recostar a
cabeça, finalmente achei você - e perdemos a nós mesmos na grande ilusão do
amorzinho terráqueo.
O
amor não precisa do outro, quem necessita é o ego. O amor se compraz.
Texto Ricardo
Martins